sábado, 7 de junho de 2025

Eduardo Pereira dos Santos continuará inspirando as lutas populares de Feira de Santana

 

Faleceu Sr. Eduardo Pereira dos Santos (13.10.1942 - 04.06.2025), uma das mais importantes personagens das lutas dos trabalhadores rurais em Feira de Santana.

Sr. Eduardo era Griô não só do Território Quilombola da Lagoa Grande, mas também de Matinha dos Pretos, Candeal II e Moita da Onça (e tantas outras ainda por reconhecer oficialmente) – já que as comunidades quilombolas de Feira de Santana são, afinal, um grande território, forjado e batalhado por gente que é “tudo parente” – como o ouvimos muitas vezes dizer. Gente que, com sua força e ousadia, furou os bloqueios criados pelo elitismo e racismo de Feira, impondo limites ao poder econômico e produzindo um jeito de se orgulhar do seu lugar e de seu modo de viver.

Mas Sr. Eduardo participou de lutas e inspirou muito para além dos limites de Feira de Santana: MOC, Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Feira de Santana, CONTAG, FETAG, CUT, APAEB, Associação Quilombola Comunitária de Maria Quitéria (AQCOMAQ) são apenas alguns exemplos de organizações de luta que contaram com sua energia, inteligência e sabedoria. A luta pela terra na Bahia deve muito a Sr. Eduardo.

Infelizmente a Feira de Santana “oficial” não registra a importância que Sr. Eduardo assume para sua história. A história contada de cima para baixo se esmera em esconder exemplos como o dele, que inspiraram lutas coletivas e insistiam em dizer não ao destino que lhes era reservado. Numa terra que tem vergonha de suas cores, suas feiras e de sua zona rural, aliás, mesmo seus(uas) iguais são levados(as) muitas vezes a deixar passar que aquele homem, negro, pequeno, franzino, de jeito simples, viveu tantas coisas, guardou e dividiu tanta sabedoria, fez parte, com suas lutas, de acontecimentos históricos centrais para as classes populares em Feira e região. Apenas um exemplo: a reviravolta popular no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Feira de Santana, criado em 1971 para atender os interesses dos grupos políticos conservadores e fazendeiros, mas que, no final da década de 1970, é ocupado pelos(as) trabalhadores(as) rurais, por meio de articulações e intensa campanha de sindicalização, em que Sr. Eduardo teve uma importante participação[i].  

A gente sempre se surpreendia quando via Sr. Eduardo pegar no microfone para falar. Daquela pessoa de aparência frágil saía uma voz potente, que tomava o ambiente e sempre se impunha, com a energia de quem acredita que a luta vale a pena, cheia da sapiência rara que não se encontra nos livros. Apesar de sua aparência frágil, continuava se fazendo presença onde houvesse luta: nas reuniões do SINTRAF/FS sempre representava sua comunidade, nas atividades da AQCOMAQ era um dos primeiros a chegar. E continuava cuidando de suas galinhas, de sua roça, de sua gente, sabedor que era da potência do produzir, a partir da terra, o alimento e a sobrevivência, como elo central da comunidade, tornando o produzir uma forma política.

Por tudo isso, a Incubadora de Iniciativas da Economia Popular e Solidária da UEFS também deve muito a Sr. Eduardo. Com ele a gente aprendia sempre e muito e continuará aprendendo, pois ele permanece vivo em cada lembrança, no seu exemplo e na sua descendência, que está aí, forte, espelhando-se nele, continunado a fazer história.

Henrique Andrade, professor do IFBA-Feira de Santana, e companheiro das lutas da IEPS-UEFS, compartilhou um poema inspirado em Sr. Eduardo Pereira dos Santos, que fica aqui também registrado, em sua homenagem.


UMA HOMENAGEM A MESTRE EDUARDO...

UTOPIAS REAIS
Por Henrique Andrade 

Essa noite tive um sonho feroz
Um eterno grande homem 
Me acordou em plena madrugada atroz
Com palavra forte e fugaz
De letra firme em sublime voz

"Caminhe pelo mundo com os iguais"
"Comuniquem a tragédia e a guerra"
"Construam pontes e o roteiro da paz"
Perguntei o que estava ocorrendo 
O aviso foi simples: "olhe para trás"

"Observem a destruição de lastro voraz"
Questionei como atravessar as mentes
E a resposta em rasgo reto tornou capaz
"Persigam o comum trajeto rude enraizado"
"E verás que deixaram para trás o rico substrato"

Senti o calor da carne em matéria desvairada
Na equação complexa esquecida deveras 
Perguntei-me acerca da vida concreta cabal
"Na travessia reflitam o sentido real"
A indagação rebelde obteve resposta final
"Acordem,  a verdade é como semente" 
Trabalho, festa e pão num destino comunal


E, para quando a saudade apertar, vale relembrar suas palavras na roda de conversa "A esperança é a última que morre", que encerrou o III CIEPS - Congresso Internacional de Economia Popular e Solidária, organizado pela IEPS-UEFS, em 2021 (sua fala principal encontra-se no vídeo a partir do minuto 17:23:00)


Roda de Conversa "A esperança é a última que morre”: economia popular e solidária, resistir e esperançar um mundo melhor
Profa. Ana Maria Motta Ribeiro (UFF) e Mestres José Caciano Pereira da Silva e Eduardo Pereira dos Santos . Mediação Prof. Emmanuel Oguri Freitas (IEPS-UEFS). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=-JUqT4W3GLY&list=PLpBZyXOc2V8HKBi4TUTKmhc-Hnx4pcyzC



[i] JESUS, Tatiana Farias de. Trabalhadoras rurais de Feira de Santana: Gênero, Poder e Luta no Sindicato (1989-2002). 2009. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2009.

quarta-feira, 7 de maio de 2025

Feirantes da Marechal não estão sendo ouvidos pela Prefeitura sobre a organização do seu espaço de trabalho

O Coletivo Trabalhadores do Centro reuniu-se no dia 25 de abril último para avaliar as ações
realizadas e planejar as lutas que se fazem necessárias no ano de 2025. 

Uma ótima notícia foi compartilhada já no início do encontro: a Associação de Trabalhadores e Trabalhadoras da Feira da Marechal já é realidade, completamente formalizada e regular. A nova Associação foi criada a partir da organização coletiva que se fez necessária diante das ameaças de expulsão dos(as) feirantes do centro da cidade e está pronta para continuar suas lutas. Integrantes da sua diretoria planejam a realização, nas próximas semanas, de uma atividade para marcar essa grande conquista.

O momento também trouxe à tona graves preocupações. A Prefeitura Municipal de Feira de Santana vem anunciando a continuidade das intervenções na Marechal Deodoro. Em reunião convocada pela Prefeitura, ocorrida em 18 de fevereiro deste ano, a Secretaria da Agricultura Municipal e o próprio Prefeito noticiaram a proposta de organização das feiras da Marechal e da Bernardino Bahia, inclusive de padronização das barracas, mas sem que fossem compartilhados maiores detalhes sobre as características dos equipamentos e ouvesse espaço para um efetivo diálogo.

A Diretoria da Associação de Trabalhadores e Trabalhadoras da Feira Marechal protocolou dois pedidos de acesso ao projeto, sem qualquer resposta. Foram recepcionados, ainda, pelo Secretário de Agricultura do Município, Silvaney Araújo, mas sem que lhes fossem disponibilizadas informações mais detalhadas.

Desde a gestão municipal anterior, os(as) Feirantes persistem na tentativa de participação no processo de organização da Marechal, sem sucesso. Já contam, inclusive, com um projeto alternativo de organização espacial e uma proposta de modelo barraca, elaborados pela arquiteta e urbanista Mabel Mota, sem que a Prefeitura Municipal se mostre proposta a realizar um efetivo diálogo. 

Hoje foi publicado no Diário Oficial do Município o aviso da Licitação n. 31-2025-16L, pregão eletrônico que acontecerá no dia 22 de maio próximo para "aquisição de barracas de feiras livres com cobertura, desmontáveis [...] visando a atender a necessidade do município de Feira de Santana". Isto se dá, no entanto, sem que ao menos os(as) Feirantes tivessem acesso ou fosse convidados(a) a opinar sobre as características do seu espaço de trabalho, desconsiderando-se a experiência viva dos(as) trabalhadores(as).

Feirantes da Marechal continuam mobilizados(as)  e alertas, preocupados(as) com o modo como o processo vem sendo conduzido pelo Poder Público municipal.


Para saber mais:


Fala de Edineide Ribeiro, Presidente da Associação de Trabalhadores e Trabalhadoras da Feira da Marechal, na sessão solene ocorrida na Câmara de Vereadores de Feira, em 10 de março de 2025, em homenagem às Mulheres feirantes.




                Chá com Zé Podcast, com a participação de Edineide Ribeiro e Mabel Mota.




quinta-feira, 17 de abril de 2025

“Nós, a gente – Mulheres de Lagoa Grande": documentário produzido a partir de dissertação com destaque no Planterr

Com muita alegria e orgulho divulgamos que a dissertação "Políticas Públicas, Participação e Emancipação: narrativas das mulheres da Comunidade Quilombola de Lagoa Grande, zona rural de Feira de Santana, Bahia”, de autoria da Profa. Adrielly Ferreira Morais, coordenadora da IEPS-UEFS, foi indicada como destaque na avaliação quadrienal 2021-2024 do PLANTERR - Programa de Pós-graduação em Planejamento Territorial da UEFS. 

Para além do texto acadêmico, que analisa, de forma competente, a experiência das mulheres do Território Quilombola da Lagoa Grande (distrito de Maria Quitéria, Feira de Santana) com políticas públicas, no contexto da emancipação e participação social, a investigação igualmente resultou na produção de um vídeo documentário, em que se faz um registro histórico da luta e vivências das mulheres daquela comunidade. 

A gravação dos vídeos aconteceu durante a XI edição do Novembro Negro da Lagoa Grande (2023), evento anual que promove na comunidade discussões em torno da identidade quilombola, território e aquilombamento. Em 2024, na XII edição do Novembro Negro, a exibição do vídeo documentário integrou a programação do evento. 

Agora o Documentário está também disponível na página do Youtube da IEPS-UEFS:


A íntegra da Dissertação também pode ser acessada na aba "Publicações" do nosso blog.

Confira! Divulgue!

quarta-feira, 12 de março de 2025

SINTRAF Feira e IEPS-UEFS: inspiradora parceria para fortalecer o associativismo rural em Feira de Santana

Planejamento Coletivo
(SINTRAF, nov. 2024)



A IEPS-UEFS tem tido a honra de atuar como parceira da Diretoria de Formação do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Agricultura Familiar do Município de Feira de Santana - SINTRAF/FS, auxiliando no planejamento e da execução de atividades formativas voltadas para o Associativismo rural de Feira de Santana.


As associações comunitárias rurais têm um papel central na organização do povo do campo em suas lutas. E são muitas as lutas necessárias, diante de um mundo que esquece, cada vez mais, a importância fundamental do campo, de seu modo de vida, de fazer cultura e de produzir o alimento que chega à mesa de todos(as).


Temas selecionados no planejamento coletivo  (SINTRAF, nov. 2024)





Os encontros, que acontecem mensalmente, pretendem trazer à discussão temas que foram selecionados a partir de uma atividade de planejamento coletivo ocorrida em 26.11.2024, na sede do SINTRAF, com participação de integrantes de diretorias de muitas associações rurais do município.

Formação sobre aspectos jurídicos
do associativismo (SINTRAF, janeiro 2025)



Em 22 de janeiro de 18 de fevereiro de 2025 o tema foram as questões jurídicas e burocráticas do Associativismo, em encontros conduzidos pela Profa. Flávia Pita, da equipe da IEPS-UEFS. Foram diálogos muito cheios de aprendizado para todos(as), pois fomos desafiados a pensar o conhecimento jurídico, em geral tão afastado da realidade das pessoas do campo, a partir das experiências reais das associações, marcadas por dificuldades em torno do acesso a informações, processos, instituições públicas e privadas, recursos tecnológicos.


Em 18 de março próximo o tema a ser abordado no ciclo de formação são as relações interpessoais. Desta vez contaremos com a participação do Prof. José Fernando Andrade, professor do curso de Psicologia e atual Coordenador de Extensão da PROEX-UEFS.

As atividades são abertas ao público e gratuitas. O convite é dirigido, em especial, às Associações rurais de Feira e seus(uas) associados(as). No dia 18 de março, ela acontece das 8:30 às 12:00h, na sede do SINTRAF Feira (Rua Juvêncio Erudilho, 420, Barroquinha, Feira de Santana). 







sábado, 14 de dezembro de 2024

Projeto Cantina Solidária VI vem aí! - chamada pública será lançada no primeiro semestre de 2025

 O Projeto Cantinas Solidárias é um dos mais importantes eixos dos trabalhos de extensão e pesquisa da Incubadora de Iniciativas da Economia Popular e Solidária da UEFS. Por meio dele, coletivos autogestionários de trabalho popular ocupam as cantinas dos módulos I e VII da UEFS, espaços pedagógicos da IEPS e, enquanto produzem e comercializam alimentos, participam de atividades formativas, fazem circular seus conhecimentos e afetos com a comunidade universitária, proporcionam interação com suas comunidades de origem e provocam a produção de conhecimentos socialmente referenciados.

O processo de incubação do grupo Sabores da Formiga (cantina do módulo VII), originário da comunidade de Olhos D'Água da Formiga (distrito de Tiquaruçu, Feira de Santana) estará completando o seu ciclo no primeiro semestre de 2025, após anos de muitas trocas, desafios, sabores e aprendizado.

Durante o primeiro semestre de 2025, assim, será iniciado novo processo seletivo para grupos interessados, nos mesmos moldes do que já ocorreu em edições anteriores (a exemplo do Projeto Cantina Solidária V - confira aqui), com previsão de início dos trabalhos na cantina do módulo VII em agosto de 2025. A chamada pública será divulgada oportunamente.

Começamos, no entanto, desde já a divulgar o nosso propósito, porque sabemos o quanto é desafiador o processo de organização dos grupos interessados. 

Maiores informações sobre o Projeto Cantinas Solidárias podem ser obtidas neste blog, aqui. É possível também tirar dúvidas através do e-mail incubadora@uefs.br



"Saberes e Sabores: feira, feiras livres, de economias, tecnologias e sabedorias" - o livro tá na rua!

A Incubadora de Iniciativas de Economia Popular e Solidária da UEFS lança livro de cunho nacional, organizado pelos professores José Raimundo Oliveira Lima (IEPS-UEFS) e Manuela Salau Brasil (Universidade Estadual de Ponta Grossa, Paraná).

A obra, que reúne textos de autores(as) de vários estados do Brasil, partiu de proposição de Grupo de Trabalho homônimo no 4° Congresso Nacional de Economia Popular e Solidária, ocorrido em outubro de 2024 na Universidade de São Paulo e organizado pela Associação Brasileira de Pesquisadores de Economia Popular e Solidária. O GT foi destaque no evento pelo número de participantes e trabalhos completos encaminhados, alguns dos quais compõem os capítulos que tratam da importância, conquistas e desafios das feiras, espaço fundamental para a economia popular e solidária.

"Os 19 trabalhos aprovados trouxeram à luz o mundo diverso, pulsante e desafiador das feiras, onde acontecem, de muitas formas diferentes, próprias a cada região e contexto cultural, ao longo de todo o território brasileiro (e para além dele!), não só trocas comerciais, mas relações de amizade, organização de lutas, expressões de arte e cultura. Fervilha nas feiras o anúncio de um mundo que é passado e futuro ao mesmo tempo, pois guardam a memória de formas mais humanas e afetuosas de trabalho e troca, assim como anunciam a esperança de transformação, pelo trabalho, de uma população para quem o “emprego” não é, e jamais foi, uma possibilidade.
[...]
Além de tudo, as feiras livres são um espaço privilegiado para pensar o modo como a vida econômica acontece para além e a despeito do Estado e, por isso, representam fenômeno sócio-político que exige atenção especial das políticas públicas, quase um “laboratório” natural para pensar a organicidade da economia desde abajo.
[...] As reflexões reunidas nesta publicação fazem fermentar muitas perguntas, cujas respostas têm sido buscadas com a parceria entre o conhecimento científico e o popular, tornada possível por meio da extensão universitária e das metodologias participativas de pesquisa". (Apresentação)

Vários capítulos têm como tema a Feira de Saberes e Sabores da UEFS, projeto da IEPS que muito nos orgulha e nos impulsiona à pesquisa e extensão popular. 

O livro está disponível de forma gratuita no formato "pdf", acessível neste link (ou clique na imagem do livro acima).

Aqueles(as), no entanto, que tiverem interesse em adquirir o livro impresso podem fazê-lo por meio deste link (https://www.livro.vc/saberes-e-sabores). 

Agradecemos toda ajuda na divulgação e distribuição!